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Woodstock 40 anos: mito ou ralidade?


Vi essa reportagem no site da Rolling Stones (http://www.rollingstone.com.br/) e achei muito importante compartilhar com vocês. Leiam.
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Reza a lenda que, se você se lembra de ter estado em Woodstock, provavelmente nunca pisou os pés no festival. Iniciada há exatos quarenta anos, a mais vigorosa romaria da história da música pop abriu alas, afinal, ao estouro da manada lisérgica e à exaltação do "espírito livre". Simplifiquemos: sair de lá com a memória intacta era tão difícil quanto Richard Nixon, então presidente dos EUA, declarar o fim da Guerra do Vietnã, ou Jim Morrison posar de garoto-propaganda.

As lembranças de Jorge Mautner, é verdade, não são lá muito claras. Mas o cantor e compositor, marinheiro na mesma barca que Caetano Veloso, Gilberto Gil e cia., garante que foi bom garoto no festival - em comparação ao resto da galera, claro. A explicação é fácil: não durou mais que algumas horas, carregado por amigos norte-americanos.

Eram tempos de auto-exílio para o rapaz de 28 anos. No Brasil, a linha-dura, praticamente um tanquinho de halterofilista de tão rígida, levou muitos a passar temporada "na gringa". A maioria foi para Londres - Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jards Macalé. Mautner durou algum tempo na capital inglesa, mas ficou alguns anos nos EUA. E foi justamente o status de exilado que moldou sua experiência na fazenda em Bethel, comunidade rural que recebeu as hordas hormonais para três dias de sexo, drogas e rock 'n' roll em porções de atacado.

"Era muita gente, todo este clima de nudismo. O que mais me marcou foi a multidão. Que multidão! Mas, na condição de exilado, minha atenção ia para o protesto. Meu olhar era o político", contou, em entrevista à reportagem do site da Rolling Stone Brasil. Guerra do Vietnã, conflitos raciais, regimes militares pipocando no planeta inteiro. O mundo de 1969, definitivamente, não estava para brincadeira.

Seis anos depois, os ventos de Woodstock sopraram no cangote brasileiro. Na fazenda Santa Virginia, em Iacanga, cidade paulista a 400 km da capital, o Festival de Águas Claras nascia com promessa de encarnar o espírito libertário do evento norte-americano. De João Gilberto a Novos Baianos, Mutantes a Raul Seixas, Wanderleia a Gilberto Gil: todo mundo deu um jeito de se enfiar lá, ainda que só para dar uma passadinha, num total de quatro edições (1975, 1981, 1983 e 1984).

"Aqui não teve muita nudez", Mautner começa sua lista de contrapontos à folia riponga dos EUA. "Woodstock teve um contexto peculiar. Teve seu Vietnã. Aqui éramos nós contra o regime militar."

Mas tudo dava na mesma: "Rock 'n' roll, claro. E o bom era que dava para tocar bem mais tempo do que em qualquer outro show! E num lugar com aquele clima de sacralidade...". Só o aspecto lisérgico não ganhou comentário do autor de "Maracatu Atômico", que viraria hit com Chico Science e sua Nação Zumbi. "Sobre drogas eu não comento."

Assim como em Bethel, o público ia de mala, cuia e barracas de acampamento para Iacanga - já os artistas ficavam na fazenda ("mas não rolava espaço para todos") ou num hotel próximo, "só a 20 minutinhos". Nesses trajetos, feitos em carroça mesmo, a trupe artística sempre esbarrava com um vendedor de leite e seu jumento. Benditos sejam. "Era a salvação! Todo mundo com aquela ressaca e aquele leite fresco!", lembrou o músico. Até que certo dia... "E não é que aparece um cantor, de quem não lembro o nome agora, e grita, 'nãããããão, cara! Não tomem isso! É veneno!'. Todo mundo caiu na gargalhada!"

Assim como em Woodstock, não dá para lembrar na integralidade tudo o que rolava naqueles festivais na Santa Virginia - ou você "nunca esteve lá". Os bons tempos com Itamar Assumpção, Moraes Moreira e tantos outros eram, ao memso tempo, "encontros de liberdade que prenunciavam a democratização" e a semente "dessa ideia de ecologia, lá, naquela fazendinha". Bem perto da natureza. Mas perto mesmo. "Me lembro que o Hermeto Pascoal ficou fascinado por um chiqueiro. E começou a tocar com os porcos! Isso é interessantíssimo."
Por Anna Virginia Balloussier
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